Artes urbanas e favelas: mudanças entre as edições
Sem resumo de edição |
Sem resumo de edição |
||
| (7 revisões intermediárias por 3 usuários não estão sendo mostradas) | |||
| Linha 1: | Linha 1: | ||
<p style="text-align: justify;">Por | <p style="text-align: justify;">Por [https://wikifavelas.com.br/index.php?title=Usuária_Discussão:Priscila_Telles Priscila Telles] e [https://wikifavelas.com.br/index.php?title=Usuário:Thiago_Matiolli Thiago Matiolli]</p> <p style="text-align: justify;">Ver também: [[Mapeamento_das_homenagens_a_Marielle_Franco|Mapeamento de homenagens à Marielle Franco]]</p> | ||
</ref> e produtor cultural da Roda Cultural de Olaria. Este último, personagem que fica no entrecruzamento dos assuntos abordados neste verbete, bem como nos exemplos tomados para ilustração do argumento: a Roda Cultural de Olaria e o Circulando - Diálogo e Comunicação na Favela. | = Introdução = | ||
No dia 05 de novembro de 2016, um sábado chuvoso, o Instituto Raízes em Movimento<ref>Para maiores informações sobre a organização, ver o verbete “Instituto Raízes em Movimento”, neste dicionário. </ref> realizou o 3º encontro do Vamos Desenrolar - Oficina de Produção de Memórias e Conhecimento<ref> Para saber mais sobre o evento, ver o Verbete “Vamos Desenrolar”, neste dicionário. </ref>, que abordava as artes urbanas. As discussões trataram do campo das expressões culturais na cidade em espaços abertos, favelas, praças públicas, ruas… A proposta foi refletir sobre as resistências e criatividade na construção desses espaços que geralmente são construídos no vácuo de políticas públicas culturais e na busca de expressões libertárias. O encontro trouxe à superfície experiências musicais, grafite, teatro, saraus, rodas culturais, enfim, caminhos alternativos de apropriação e combate à indústria cultural de massa. Os Dinamizadores foram: Adriana Lopes: pesquisadora e professora da UFRRJ; Carlos Meijueiro: pesquisador e ativista cultural; Cláudio Vaz: professor de artes e ativista cultural; Gustavo Coelho: pesquisador sobre pichação e outras culturas de rua (diretor do documentário “Luz Câmera, Pichação”); e Rico Neurótico: MC<ref>O termo MC é uma adaptação do inglês master of cerimony, que significa Mestre de Cerimônia. É aquele (a) que, enquanto a é tocada, elabora, recita e canta suas rimas e poesias. | |||
</ref> e produtor cultural da Roda Cultural de Olaria. Este último, personagem que fica no entrecruzamento dos assuntos abordados neste verbete, bem como nos exemplos tomados para ilustração do argumento: a Roda Cultural de Olaria e o Circulando - Diálogo e Comunicação na Favela. | |||
| |||
<p style="text-align: justify;">O tema das “artes urbanas” não é de conceituação simples e, muito menos, taxativa. Porém, quando retomamos o debate promovido pela edição do Vamos Desenrolar citado acima, é possível encontrar algumas pistas. Por exemplo, Adriana Lopes iniciou a conversa falando sobre a importância do funk e a presença potente das mulheres nesse ambiente produtivo, destacando que “a arte urbana é mais que o grafismo, a gente escreve com nossos corpos, com nossas roupas...”; Cláudio Vaz disse que não se importava de ter seus projetos copiados por outros produtores e com humor afirmou “Se fizer bem feito é bom, se não fizer bem eu vou lá e reclamo!”; Gustavo Coelho lembrou dos movimentos “xarpi” - que será retomado mais a frente -, bate bola e baile funk “A pixação não é feia, pelo contrário, tem muita delicadeza no traço”; e, por fim, mas não menos importante, MC Rico Neurótico lembrou que “A rua não é só a ferramenta, é o nosso campo de atuação..”</p> <p style="text-align: justify;">No intuito de se aproximar de uma caracterização das artes urbanas que norteie este verbete, exploraremos melhor estas pistas na próxima seção. </p> <p style="text-align: justify;"> </p> | |||
== Artes Urbanas == | == Artes Urbanas == | ||
As falas destacadas acima nos trazem várias características das artes artes urbanas: a importância dos corpos; o apreço pela questão estética e a qualidade da obra; as possibilidades de sua prática enquanto resistência; a diversidades das linguagens que a compõem: a música, as artes plásticas (como o grafite e a pichação), as representações teatrais (como os bate-bolas citados) - aos quais podemos somar a literatura, a dança, e o audiovisual; e, ainda, a rua, ou o espaço público como lugar predominante de sua manifestação. Aqui, não abordaremos todas essas dimensões, focaremos em duas delas (sem, contudo, deixar totalmente de lado, as demais): sua pluralidade e o espaço público como seu palco principal. | As falas destacadas acima nos trazem várias características das artes artes urbanas: a importância dos corpos; o apreço pela questão estética e a qualidade da obra; as possibilidades de sua prática enquanto resistência; a diversidades das linguagens que a compõem: a música, as artes plásticas (como o grafite e a pichação), as representações teatrais (como os bate-bolas citados) - aos quais podemos somar a literatura, a dança, e o audiovisual; e, ainda, a rua, ou o espaço público como lugar predominante de sua manifestação. Aqui, não abordaremos todas essas dimensões, focaremos em duas delas (sem, contudo, deixar totalmente de lado, as demais): sua pluralidade e o espaço público como seu palco principal. | ||
<p style="text-align: justify;">A cidade está longe de ser um lugar que possa ser compreendido em sua totalidade. Seus habitantes cultivam estilos particulares de entretenimento, mantém vínculos de sociabilidade e relacionamento, criam modos e padrões culturais diferenciados. Marcada, então, pela sua diversidade e heterogeneidade, a cidade se encontra como lugar privilegiado para análise de uma multiplicidade de atividades e formas de participação. Dentre essas formas de participação, as expressões artísticas, em suas diversas dimensões – sonoras, visuais e performativas –, têm se mostrado um objeto relevante para se pensar essa urbe. Como veremos na realização dos festivais circulando.</p> <p style="text-align: justify;">A rua, cada vez mais, tem se tornado palco de diferentes tipos de manifestações artísticas e culturais. Em uma caminhada vespertina pelo centro da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, é possível ver músicos de rua, artistas circenses, entre outros que, encontram nesses espaços, lócus para suas atividades. Afastando-se um pouco da região central carioca, nota-se que em diversos bairros das Zonas Norte, Sul e Oeste, as praças também têm sido logradouro de manifestações deste cunho. As Rodas Culturais e, mais especificamente, a Roda de Olaria é um importante exemplo disso. </p> <p style="text-align: justify;"> </p> | <p style="text-align: justify;">A cidade está longe de ser um lugar que possa ser compreendido em sua totalidade. Seus habitantes cultivam estilos particulares de entretenimento, mantém vínculos de sociabilidade e relacionamento, criam modos e padrões culturais diferenciados. Marcada, então, pela sua diversidade e heterogeneidade, a cidade se encontra como lugar privilegiado para análise de uma multiplicidade de atividades e formas de participação. Dentre essas formas de participação, as expressões artísticas, em suas diversas dimensões – sonoras, visuais e performativas –, têm se mostrado um objeto relevante para se pensar essa urbe. Como veremos na realização dos festivais circulando.</p> <p style="text-align: justify;">A rua, cada vez mais, tem se tornado palco de diferentes tipos de manifestações artísticas e culturais. Em uma caminhada vespertina pelo centro da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, é possível ver músicos de rua, artistas circenses, entre outros que, encontram nesses espaços, lócus para suas atividades. Afastando-se um pouco da região central carioca, nota-se que em diversos bairros das Zonas Norte, Sul e Oeste, as praças também têm sido logradouro de manifestações deste cunho. As Rodas Culturais e, mais especificamente, a Roda de Olaria é um importante exemplo disso. </p> <p style="text-align: justify;"> </p> | ||
| | ||
== Artes urbanas e periferia == | == Artes urbanas e periferia == | ||
<p style="text-align: justify;">As relações entre cidade e favela, ou outras formas espaciais periféricas, podem ser pensadas, em suas diversas dimensões, sob a chave de uma dualidade: a importância dos corpos e energias de moradoras/es desses espaços são indispensáveis para o funcionamento da cidade como um todo; ao mesmo tempo em que há uma profunda necessidade de controle social destas populações, tendo em vista o tensionamento que sua circulação pelo espaço urbano causa. Sob este pano de fundo que devemos refletir sobre as artes urbanas produzidas e vivenciadas nas favelas. </p> <p style="text-align: justify;">O caráter indispensável de moradoras/es da periferia para o funcionamento da vida citadina foi ressaltado na realização da edição de 2017 do Circulando, com o lema: “o rolé das favelas produz cidade<ref>A cada ano, o Circulando tem um mote diferente e, em alguns deles, uma camisa com seu lema é vendida no evento. Em 2017 foi rolébilidade; em 2015, com o mote da memória, a camisa trazia o lema: “Meu nome é favela, minha história também”; e, em 2018, abordando a diversidade, o slogan foi “somos juntxs”. </ref>” - em termos concretos e simbólicos. O mote daquele ano era mobilidade urbana, ou melhor, “rolébilidade” - entendida como a forma de mobilidade periférica, com todas suas dificuldades e estratégias, desde a debilidade do transporte público até às circulações internas à favelas, pelos seus becos<ref>Ver o verbete “mobilidades”, neste dicionário. | <p style="text-align: justify;">As relações entre cidade e favela, ou outras formas espaciais periféricas, podem ser pensadas, em suas diversas dimensões, sob a chave de uma dualidade: a importância dos corpos e energias de moradoras/es desses espaços são indispensáveis para o funcionamento da cidade como um todo; ao mesmo tempo em que há uma profunda necessidade de controle social destas populações, tendo em vista o tensionamento que sua circulação pelo espaço urbano causa. Sob este pano de fundo que devemos refletir sobre as artes urbanas produzidas e vivenciadas nas favelas. </p> <p style="text-align: justify;">O caráter indispensável de moradoras/es da periferia para o funcionamento da vida citadina foi ressaltado na realização da edição de 2017 do Circulando, com o lema: “o rolé das favelas produz cidade<ref>A cada ano, o Circulando tem um mote diferente e, em alguns deles, uma camisa com seu lema é vendida no evento. Em 2017 foi rolébilidade; em 2015, com o mote da memória, a camisa trazia o lema: “Meu nome é favela, minha história também”; e, em 2018, abordando a diversidade, o slogan foi “somos juntxs”. </ref>” - em termos concretos e simbólicos. O mote daquele ano era mobilidade urbana, ou melhor, “rolébilidade” - entendida como a forma de mobilidade periférica, com todas suas dificuldades e estratégias, desde a debilidade do transporte público até às circulações internas à favelas, pelos seus becos<ref>Ver o verbete “mobilidades”, neste dicionário. | ||
| Linha 16: | Linha 24: | ||
<p style="text-align: justify;">Os exemplos da Roda de Olaria e do Circulando ilustram bem a ideia de falar em “artes urbanas” para tratar da produção cultural oriunda das populações faveladas, por conta de duas de suas características: a primeira é a diversidade de manifestações (por isso, o plural) e a fuga de um concepção de arte pensada a partir de um parâmetro estético mais estático, que considera apenas as formas mais hegemônicas e legitimadas, muitas vezes condensadas no que se costuma chamar de cultura erudita; a segunda, que diz mais respeito ao adjetivo “urbano”, aponta para o espaço por excelência de dessa produção cultural, que é o espaço público, da cidade. </p> <p style="text-align: justify;">Todavia, retomando as pistas oferecidas pelo debate promovido no encontro sobre “artes urbanas” do Vamos Desenrolar citado lá no começo do texto, vemos que também estão envolvidas as questões do corpo, da resistência e do apuro estético. Esse conjunto de elementos nos abre um mar de possibilidades de reflexão em torno do triângulo: arte, favelas e cidades. </p> <p style="text-align: justify;"> </p> | <p style="text-align: justify;">Os exemplos da Roda de Olaria e do Circulando ilustram bem a ideia de falar em “artes urbanas” para tratar da produção cultural oriunda das populações faveladas, por conta de duas de suas características: a primeira é a diversidade de manifestações (por isso, o plural) e a fuga de um concepção de arte pensada a partir de um parâmetro estético mais estático, que considera apenas as formas mais hegemônicas e legitimadas, muitas vezes condensadas no que se costuma chamar de cultura erudita; a segunda, que diz mais respeito ao adjetivo “urbano”, aponta para o espaço por excelência de dessa produção cultural, que é o espaço público, da cidade. </p> <p style="text-align: justify;">Todavia, retomando as pistas oferecidas pelo debate promovido no encontro sobre “artes urbanas” do Vamos Desenrolar citado lá no começo do texto, vemos que também estão envolvidas as questões do corpo, da resistência e do apuro estético. Esse conjunto de elementos nos abre um mar de possibilidades de reflexão em torno do triângulo: arte, favelas e cidades. </p> <p style="text-align: justify;"> </p> | ||
== Referências bibliográficas == | == Referências bibliográficas == | ||
<p style="text-align: justify;">ALVES, Rôssi. Resistência e empoderamento na literatura urbana carioca. Estudos de literatura brasileira contemporânea, n. 49, p. 183-202, set./dez. 2016.</p> <p style="text-align: justify;">CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.</p> <p style="text-align: justify;">FOUCAULT, Michel. O Nascimento da Medicina Social. In.: FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 20ª edição. Rio de Janeiro, Graal, 2005, pp.79-98.</p> <p style="text-align: justify;">INSTITUTO RAÍZES EM MOVIMENTO. Instituto Raízes em Movimento: um canto à experiência. In.: SANTOS JÚNIOR, Orlando Alves do; NOVAES, Patrícia Ramos; LACERDA, Larissa; WERNECK, Mariana (Orgs.). Caderno Didático “Políticas Públicas e Direito à Cidade: Programa Interdisciplinar de Formação de Agentes Sociais”, Observatório das Metrópoles, 2017, 135-142)</p> <p style="text-align: justify;">OLIVEIRA, Priscila Telles de. Roda Cultural de Olaria: "resistência" e formas de atuação. 2018, 149f. Dissertação (Mestrado em Antropologia) ,Universidade Federal Fluminense (UFF). Niterói, 2018.</p> <p style="text-align: justify;">TOPALOV, Christian. Da questão social aos problemas urbanos: os reformadores e a população das metrópoles em princípios do século XX. In.: RIBEIRO, Luiz Cesar Queiroz; PECHMAN, Robert Moses (Org.). Cidade, povo e nação: gênese do urbanismo moderno. Rio de Janeiro, Letra Capital, Observatório das Metrópoles, INCT, 2015, pp. 23 – 52. Disponível em: [http://web.observatoriodasmetropoles.net/images/abook_file/cidade_povo_nacao2ed.pdf http://web.observatoriodasmetropoles.net/images/abook_file/cidade_povo_nacao2ed.pdf].</p> <p style="text-align: justify;"> </p> | <p style="text-align: justify;">ALVES, Rôssi. Resistência e empoderamento na literatura urbana carioca. Estudos de literatura brasileira contemporânea, n. 49, p. 183-202, set./dez. 2016.</p> <p style="text-align: justify;">CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.</p> <p style="text-align: justify;">FOUCAULT, Michel. O Nascimento da Medicina Social. In.: FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 20ª edição. Rio de Janeiro, Graal, 2005, pp.79-98.</p> <p style="text-align: justify;">INSTITUTO RAÍZES EM MOVIMENTO. Instituto Raízes em Movimento: um canto à experiência. In.: SANTOS JÚNIOR, Orlando Alves do; NOVAES, Patrícia Ramos; LACERDA, Larissa; WERNECK, Mariana (Orgs.). Caderno Didático “Políticas Públicas e Direito à Cidade: Programa Interdisciplinar de Formação de Agentes Sociais”, Observatório das Metrópoles, 2017, 135-142)</p> <p style="text-align: justify;">OLIVEIRA, Priscila Telles de. Roda Cultural de Olaria: "resistência" e formas de atuação. 2018, 149f. Dissertação (Mestrado em Antropologia) ,Universidade Federal Fluminense (UFF). Niterói, 2018.</p> <p style="text-align: justify;">TOPALOV, Christian. Da questão social aos problemas urbanos: os reformadores e a população das metrópoles em princípios do século XX. In.: RIBEIRO, Luiz Cesar Queiroz; PECHMAN, Robert Moses (Org.). Cidade, povo e nação: gênese do urbanismo moderno. Rio de Janeiro, Letra Capital, Observatório das Metrópoles, INCT, 2015, pp. 23 – 52. Disponível em: [http://web.observatoriodasmetropoles.net/images/abook_file/cidade_povo_nacao2ed.pdf http://web.observatoriodasmetropoles.net/images/abook_file/cidade_povo_nacao2ed.pdf].</p> <p style="text-align: justify;"> </p> | ||
[[Category:Arte Urbana]] [[Category:Grafite]] [[Category:Arte]] [[Category:Cultura]] | |||
== Teste Semântico == | |||
*Eixo de análise: [[Eixo de análise::Sociabilidade e Cultura]] | |||
*Temática: [[Temática::Cultura]] | |||
__SHOWFACTBOX__ | |||
[[Category:Arte Urbana]][[Category:Grafite]][[Category:Arte]][[Category:Temática - Cultura]][[Category:Complexo do Alemão]] | |||
