Marielle Franco: mudanças entre as edições

Sem resumo de edição
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Já em sua atuação como vereadora, Marielle ressaltava a importância da articulação dos diversos movimentos feministas, como constantemente afirmava “das feministas históricas às feministas das hashtags”, o que não se limitou a mera retórica. Durante seu mandato, todas as ações parlamentares referentes aos direitos das mulheres foram realizadas em articulação e/ou consulta aos mais diversos movimentos feministas, de mulheres lésbicas, negras, jovens, instituições e militantes históricas com atuação nas pautas do enfrentamento à violência contra as mulheres, saúde sexual e saúde reprodutiva, entre outros. 
Já em sua atuação como vereadora, Marielle ressaltava a importância da articulação dos diversos movimentos feministas, como constantemente afirmava “das feministas históricas às feministas das hashtags”, o que não se limitou a mera retórica. Durante seu mandato, todas as ações parlamentares referentes aos direitos das mulheres foram realizadas em articulação e/ou consulta aos mais diversos movimentos feministas, de mulheres lésbicas, negras, jovens, instituições e militantes históricas com atuação nas pautas do enfrentamento à violência contra as mulheres, saúde sexual e saúde reprodutiva, entre outros. 


Algumas das construções mais emblemáticas foram, a construção do Projeto de Lei pela garantia do atendimento aos casos de aborto legal na cidade do Rio de Janeiro, construído em articulação e consultas com com diversas organizações e referências  movimento feminista e de saúde do Rio de Janeiro, apresentado no primeiro dia de sua legislatura; e do Projeto de Lei que tornava o Dia da Visibilidade Lésbica (29 de agosto) uma data oficial do calendário municipal. Mesmo não aprovado, as articulações em torno do PL impulsionaram a construção da Frente Lésbica do Rio de Janeiro. Reprovado por apenas dois votos de diferença, foi o projeto com temática LGBT que chegou mais perto de ser aprovado na Câmara municipal do Rio de Janeiro.
Algumas das construções mais emblemáticas foram, a construção do Projeto de Lei pela garantia do atendimento aos casos de aborto legal na cidade do Rio de Janeiro, construído em articulação e consultas com diversas organizações e referências  movimento feminista e de saúde do Rio de Janeiro, apresentado no primeiro dia de sua legislatura; e do Projeto de Lei que tornava o Dia da Visibilidade Lésbica (29 de agosto) uma data oficial do calendário municipal. Mesmo não aprovado, as articulações em torno do PL impulsionaram a construção da Frente Lésbica do Rio de Janeiro. Reprovado por apenas dois votos de diferença, foi o projeto com temática LGBT que chegou mais perto de ser aprovado na Câmara municipal do Rio de Janeiro.


= <span style="font-size:large;">'''Negra'''</span> =
= <span style="font-size:large;">'''Negra'''</span> =
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= <span style="font-size:large;">'''Vereadora'''</span> =
= <span style="font-size:large;">'''Vereadora'''</span> =


A decisão de se candidatar a vereadora nas eleições de 2016 refletia o acúmulo político da trajetória pessoal e de militância de Marielle. Sua campanha foi realizada de forma reconhecidamente ousada e coletiva. Mulher na rua, na luta e na raça, #MulheRaça, foi o slogan de sua pré-campanha. &nbsp;Já durante a campanha, através do lema “Eu sou porque nós somos”, inspirado no provérbio africano “Ubuntu” anunciava sua candidatura como uma construção coletiva e suas posições como defensora de direitos humanos, feminista, favelada e negra. Já colocava em prática sua preocupação com a participação das mulheres nos espaços de decisão, viabilizando espaços infantis/recreativos em todas as atividades de campanha e posteriormente, de seu mandato. Esta experiência foi transformada em um panfleto orientador sobre espaços infantis para outros mandatos, partidos e coletivos. O material foi lançado durante o evento Mulheres na Política, realizado em 30 de novembro de 2017 pelo mandato, marcando a imensa importância das vozes das mães para a construção das políticas implementadas por Marielle Franco.
A decisão de se candidatar a vereadora nas eleições de 2016 refletia o acúmulo político da trajetória pessoal e de militância de Marielle. Sua campanha foi realizada de forma reconhecidamente ousada e coletiva. Mulher na rua, na luta e na raça, #MulheRaça, foi o slogan de sua pré-campanha. Já durante a campanha, através do lema “Eu sou porque nós somos”, inspirado no provérbio africano “Ubuntu” anunciava sua candidatura como uma construção coletiva e suas posições como defensora de direitos humanos, feminista, favelada e negra. Já colocava em prática sua preocupação com a participação das mulheres nos espaços de decisão, viabilizando espaços infantis/recreativos em todas as atividades de campanha e posteriormente, de seu mandato. Esta experiência foi transformada em um panfleto orientador sobre espaços infantis para outros mandatos, partidos e coletivos. O material foi lançado durante o evento Mulheres na Política, realizado em 30 de novembro de 2017 pelo mandato, marcando a imensa importância das vozes das mães para a construção das políticas implementadas por Marielle Franco.


Como resultado dessa potente campanha, Marielle foi eleita eleita com 46.502 votos, a quinta parlamentar mais votada da cidade do Rio de Janeiro e a &nbsp;segunda mulher com mais votos. Gostava de sempre salientar que, de todas as urnas computadas na cidade do Rio de Janeiro, em 100% delas foram computados votos no 50777, seu número durante a campanha eleitoral de 2016.
Como resultado dessa potente campanha, Marielle foi eleita eleita com 46.502 votos, a quinta parlamentar mais votada da cidade do Rio de Janeiro e a &nbsp;segunda mulher com mais votos. Gostava de sempre salientar que, de todas as urnas computadas na cidade do Rio de Janeiro, em 100% delas foram computados votos no 50777, seu número durante a campanha eleitoral de 2016.
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Marielle chegou na &nbsp;Câmara com o “pé na porta” expressão recorrentemente usada por ela. Já no primeiro dia de legislatura, apresentou projetos de lei, realizou pronunciamentos marcantes e usou massivamente as redes sociais para divulgar seu trabalho coletivo e convocar a população à participação política. Entendendo a importância da internet como principal forma de comunicação nos dias de hoje, o mandato organizou dois encontros com ativistas transmitidos online através das redes sociais. O primeiro deles foi sobre feminismo nas ruas e nas redes, abordando toda a diversidade das mulheres feministas; o segundo foi sobre maternidade, mais uma vez demonstrando a importância do tema para a trajetória e atuação de Marielle.
Marielle chegou na &nbsp;Câmara com o “pé na porta” expressão recorrentemente usada por ela. Já no primeiro dia de legislatura, apresentou projetos de lei, realizou pronunciamentos marcantes e usou massivamente as redes sociais para divulgar seu trabalho coletivo e convocar a população à participação política. Entendendo a importância da internet como principal forma de comunicação nos dias de hoje, o mandato organizou dois encontros com ativistas transmitidos online através das redes sociais. O primeiro deles foi sobre feminismo nas ruas e nas redes, abordando toda a diversidade das mulheres feministas; o segundo foi sobre maternidade, mais uma vez demonstrando a importância do tema para a trajetória e atuação de Marielle.


Em um ano e três meses de uma “mandata”, que deveria ter durado pelo menos quatro, concretizou uma política feminista, em defesa da população negra, LGBT e de favelas. Apresentou 16 projetos de lei, presidiu a Comissão de Defesa da &nbsp;Mulher e foi nomeada relatora &nbsp;da Comissão Especial de acompanhamento da Intervenção Federal.<br/> Para isso, não chegou à Câmara sozinha, constituiu uma equipe majoritariamente feminina (mais de 80% eram mulheres), negra, com moradoras/es de favela, LGBTs e mães. Nomeou Lana de Holanda, mulher trans, primeira assessora na história da Câmara do Rio de Janeiro a conseguir o direito ao nome social em seu crachá funcional. Corpos que assim como o seu não eram reconhecidos como habituais naquele espaço e que ainda abriram as portas para outros. Jovens mulheres negras entraram pela primeira vez na Câmara para participar do “rolezinho” pelo palácio repleto de imagens coloniais; &nbsp;povos de religiões de matriz africana ocuparam o plenário para assistir o debate público “Awre aos nossos ancestrais - Reexistir na Fé!”; mulheres negras constituíram integralmente a mesa da &nbsp;entrega da Medalha Pedro Ernesto à Conceição Evaristo, numa noite emocionante com plenário e galerias cheias.
Em um ano e três meses de uma “mandata”, que deveria ter durado pelo menos quatro, concretizou uma política feminista, em defesa da população negra, LGBT e de favelas. Apresentou 16 projetos de lei, presidiu a Comissão de Defesa da &nbsp;Mulher e foi nomeada relatora &nbsp;da Comissão Especial de acompanhamento da Intervenção Federal. Para isso, não chegou à Câmara sozinha, constituiu uma equipe majoritariamente feminina (mais de 80% eram mulheres), negra, com moradoras/es de favela, LGBTs e mães. Nomeou Lana de Holanda, mulher trans, primeira assessora na história da Câmara do Rio de Janeiro a conseguir o direito ao nome social em seu crachá funcional. Corpos que assim como o seu não eram reconhecidos como habituais naquele espaço e que ainda abriram as portas para outros. Jovens mulheres negras entraram pela primeira vez na Câmara para participar do “rolezinho” pelo palácio repleto de imagens coloniais; &nbsp;povos de religiões de matriz africana ocuparam o plenário para assistir o debate público “Awre aos nossos ancestrais - Reexistir na Fé!”; mulheres negras constituíram integralmente a mesa da &nbsp;entrega da Medalha Pedro Ernesto à Conceição Evaristo, numa noite emocionante com plenário e galerias cheias.


Mas não era só a Câmara municipal que Marielle e sua mandata ocuparam. Também estiveram nas ruas, por vários territórios da cidade. Realizaram o Seminário Direito à Favela, que aconteceu no Museu da Maré; o Ocupa OcupaDH no Salgueiro, junto com a Comissão de Direitos Humanos na Alerj e a Associação de Moradores; visitou maternidades públicas do Rio de Janeiro; distribuiu pelos blocos de carnaval espalhados por todas as regiões da cidade mais de 200 mil leques da campanha “Não é Não! #carnavalsemassédio”, pela Comissão da Mulher.
Mas não era só a Câmara municipal que Marielle e sua mandata ocuparam. Também estiveram nas ruas, por vários territórios da cidade. Realizaram o Seminário Direito à Favela, que aconteceu no Museu da Maré; o OcupaDH no Salgueiro, junto com a Comissão de Direitos Humanos na Alerj e a Associação de Moradores; visitou maternidades públicas do Rio de Janeiro; distribuiu pelos blocos de carnaval espalhados por todas as regiões da cidade mais de 200 mil leques da campanha “Não é Não! #carnavalsemassédio”, pela Comissão da Mulher.


Não ocupar a política sozinha era um compromisso político de Marielle Franco. Mulheres na política, evento realizado em novembro de 2017, foi o maior de seu mandato reunindo mais de 600 pessoas no auditório da ABI. O evento foi construído em articulação com mulheres que pretendiam se candidatar nas eleições seguintes.
Não ocupar a política sozinha era um compromisso político de Marielle Franco. Mulheres na política, evento realizado em novembro de 2017, foi o maior de seu mandato reunindo mais de 600 pessoas no auditório da ABI. O evento foi construído em articulação com mulheres que pretendiam se candidatar nas eleições seguintes.
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A frente da presidência da Comissão da Mulher, Marielle inovou ao trazer sua experiência anterior e torná-la também um espaço de atendimento às mulheres e não só um espaço burocrático. Neste período a comissão da mulher atuou no acolhimento, orientação e acompanhamento de 45 casos relacionados aos direitos das mulheres, desde casos de assédio na rua, assédio no ambiente de trabalho, agressão física, violência sexual e até feminicídios.&nbsp;
A frente da presidência da Comissão da Mulher, Marielle inovou ao trazer sua experiência anterior e torná-la também um espaço de atendimento às mulheres e não só um espaço burocrático. Neste período a comissão da mulher atuou no acolhimento, orientação e acompanhamento de 45 casos relacionados aos direitos das mulheres, desde casos de assédio na rua, assédio no ambiente de trabalho, agressão física, violência sexual e até feminicídios.&nbsp;


Grande parte desta experiência está registrada no relatório da Comissão da Mulher, que já &nbsp;estava sendo produzido &nbsp;com os dados de trabalho do primeiro ano de trabalho. Após a noite de 14 de Março, o material foi finalizado pela equipe da Mandata Marielle Franco, revisado e ampliado para incorporar tudo que foi construído até o dia 14 de Março de 2018.&nbsp;<br/> A curta e intensa experiência da Mandata Marielle Franco, repercutiu o feminismo que acreditamos, construído de gerações em gerações, traçando a política no coletivo, sem suprimir nossa diversidade. &nbsp;“Diversas mas não dispersas’! Não podemos deixar de apontar, no entanto, que seu término violento reflete a ausência de uma democracia plena em nosso país, negada a milhares de pessoas, que se sentiam representadas por Marielle Franco.
Grande parte desta experiência está registrada no relatório da Comissão da Mulher, que já &nbsp;estava sendo produzido &nbsp;com os dados de trabalho do primeiro ano de trabalho. Após a noite de 14 de Março, o material foi finalizado pela equipe da Mandata Marielle Franco, revisado e ampliado para incorporar tudo que foi construído até o dia 14 de Março de 2018.&nbsp;
 
A curta e intensa experiência da Mandata Marielle Franco, repercutiu o feminismo que acreditamos, construído de gerações em gerações, traçando a política no coletivo, sem suprimir nossa diversidade. &nbsp;“Diversas mas não dispersas’! Não podemos deixar de apontar, no entanto, que seu término violento reflete a ausência de uma democracia plena em nosso país, negada a milhares de pessoas, que se sentiam representadas por Marielle Franco.


= '''<span style="font-size:large;">Semente</span>''' =
= '''<span style="font-size:large;">Semente</span>''' =
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Marielle hoje é uma símbolo da luta internacional feminista e negra. Foi a principal homenageada 8 de Março (Dia Internacional de Luta das Mulheres) de 2019. O dia 14 de Março agora também faz parte do calendário de lutas dos movimentos feministas, LGBTs, negros e outros. Após mais de um ano de seu assassinato, seu rosto, nome e frases continuam estampados em grafites, cartazes, placas e intervenções urbanas espalhados pelo mundo. Nomeia coletivos feministas, negros, LGBTs, universitários, pré-vestibulares, assentamentos e ocupações por moradia, e a Tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Esta última, local onde por tantas vezes Marielle subiu para denunciar violações aos direitos humanos das mulheres, LGBTs, do povo negro e de favelas.
Marielle hoje é uma símbolo da luta internacional feminista e negra. Foi a principal homenageada 8 de Março (Dia Internacional de Luta das Mulheres) de 2019. O dia 14 de Março agora também faz parte do calendário de lutas dos movimentos feministas, LGBTs, negros e outros. Após mais de um ano de seu assassinato, seu rosto, nome e frases continuam estampados em grafites, cartazes, placas e intervenções urbanas espalhados pelo mundo. Nomeia coletivos feministas, negros, LGBTs, universitários, pré-vestibulares, assentamentos e ocupações por moradia, e a Tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Esta última, local onde por tantas vezes Marielle subiu para denunciar violações aos direitos humanos das mulheres, LGBTs, do povo negro e de favelas.


A frase que diz que marielle virou semente se mostrou muito forte também durante o período eleitoral de 2018. Houve um considerável aumento de candidaturas de mulheres negras, refletindo também na eleição de algumas parlamentares negras, sobretudo nos partidos de esquerda. Em especial, três mulheres negras que compunham o mandato de Marielle Franco se candidataram e foram eleitas deputadas estaduais no Rio de Janeiro: Dani Monteiro, Mônica Francisco e Renata Souza.
A frase que diz que Marielle virou semente se mostrou muito forte também durante o período eleitoral de 2018. Houve um considerável aumento de candidaturas de mulheres negras, refletindo também na eleição de algumas parlamentares negras, sobretudo nos partidos de esquerda. Em especial, três mulheres negras que compunham o mandato de Marielle Franco se candidataram e foram eleitas deputadas estaduais no Rio de Janeiro: Dani Monteiro, Mônica Francisco e Renata Souza.


Hoje, sua família e companheira são incansáveis na tarefa de representá-la mundo afora. As e os &nbsp;integrantes de sua mandata, suas amigas e amigos, companheiras e companheiros de partido e militância propagam a sua história e luta através de inúmeras iniciativas e registros dessa memória. Assim como estamos fazendo neste dicionário que leva seu nome.
Hoje, sua família e companheira são incansáveis na tarefa de representá-la mundo afora. As e os &nbsp;integrantes de sua mandata, suas amigas e amigos, companheiras e companheiros de partido e militância propagam a sua história e luta através de inúmeras iniciativas e registros dessa memória. Assim como estamos fazendo neste dicionário que leva seu nome.