Drogas e religião nas favelas: mudanças entre as edições

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A despeito de tudo isso, nas pesquisas realizadas observa-se que os adeptos das religiões afro-brasileiras, seguem buscando formas de comunicação, sobrevivência e (re)existências nessas áreas. Estão imersos em múltiplas e complexas relações sociais, locais, regionais e nacionais, marcadas por formas diversas de conflito, aliança e negociação.
A despeito de tudo isso, nas pesquisas realizadas observa-se que os adeptos das religiões afro-brasileiras, seguem buscando formas de comunicação, sobrevivência e (re)existências nessas áreas. Estão imersos em múltiplas e complexas relações sociais, locais, regionais e nacionais, marcadas por formas diversas de conflito, aliança e negociação.
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= Traficantes evangélicos em favelas =
= Traficantes evangélicos em favelas =
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Ao longo das décadas do século XX observou-se o crescimento no número daqueles que se autodeclaravam evangélicos no Brasil. Em 1940, quando a religião passa a ser contabilizada de modo sistemático nos censos decenais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia 95,2% católicos, 2,6% evangélicos, 0,2% sem religião. Os evangélicos avançaram para 3,4% em 1950, 4% em 1960, 5,2% em 1970, 6,6% em 1980, 9% em 1991, 15,5% em 2000 e 22,2% em 2010. Segundo dados de 2016 do Instituto Datafolha, um terço da população nacional já é evangélico. Vale lembrar que este crescimento evangélico é, sobretudo, urbano (Lopes 2006) e localiza-se majoritariamente em favelas e periferias (Vital da Cunha 2018). Em meados dos anos 1990, a crescente presença evangélica em favelas cariocas se expressava na paisagem sonora, visual e estabelecia novos marcadores de sociabilidade (Mafra 1998; Vital da Cunha 2002 e 2014; Machado 2013; Alvito 2001). Os cultos numerosos ocorriam em templos, mas ocupavam o ambiente sonoro da favela. Assim também as músicas gospel e hinos eram entoados em diferentes espaços seja por seus moradores, individualmente, seja por comerciantes que exibiam às alturas o som das cantoras gospel da moda em cada momento. Em termos visuais, evangélicos estavam presentes no marketing das igrejas que disponibilizavam pelas ruas cartazes e faixas anunciando a presença de personalidades em seus cultos semanais, correntes, campanhas. Também havia as pinturas murais com referências a Jesus, ao exército de Cristo, a passagens bíblicas do Antigo e do Novo Testamento. A sociabilidade nas favelas também sofreu mudanças a partir desta reconfiguração religiosa do espaço: a festa junina, as comemorações de São Cosme e Damião, assim como de São Jorge perderam centralidade e deixaram de estabelecer os espaços de encontro e fruição públicos que representavam até início dos anos 2000 (Gomes 2009; Pitrez 2012). Na esteira destas mudanças, observamos o surgimento de relações entre atores sociais de universos morais socialmente distintos: cristãos evangélicos e traficantes de drogas. O fortalecimento desta relação, ora criticado por evangélicos e não evangélicos, ora incentivado como uma missão nobre produziu muitos corolários locais e supralocais. Em termos mais gerais, a figura do “traficante evangélico” no Rio de Janeiro ganhou publicidade na mídia em 2008 com a formação de grupos de combate à Intolerância Religiosa que apresentavam com alarde essa aproximação de traficantes com pentecostais e neopentecostais em favelas. Denunciavam a situação liminar, devastadora, violenta que representaria para religiosos de matriz afro-brasileira residentes nestas em favelas e periferias as composições entre criminalidade e redes evangélicas. Antes disso, já vinha sendo acompanhado por parte da bibliografia especializada, ao mesmo tempo em que em textos ficcionais, a formação de alianças e a conversão de muitos chefes do tráfico de diferentes favelas cariocas (Lins e Lourdes da Silva 1990; Lins 1997; Alvito 2001; Laranjeira 2004; Vital da Cunha 2008; Abumanssur 2008 e 2009; Teixeira 2011 e 2013). Estar no comércio ilegal de drogas e participar de redes e de cultos, campanhas e demais atividades religiosas evangélicas nas favelas já não era incomum. Embora integrem mundos sociais distintos, com diferentes convenções e moralidades, o fazer urbano e social nestas localidades permitiu uma aproximação entre um cristianismo da “batalha espiritual” com os “senhores da guerra” locais que produz ainda muitos desdobramentos.
Ao longo das décadas do século XX observou-se o crescimento no número daqueles que se autodeclaravam evangélicos no Brasil. Em 1940, quando a religião passa a ser contabilizada de modo sistemático nos censos decenais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia 95,2% católicos, 2,6% evangélicos, 0,2% sem religião. Os evangélicos avançaram para 3,4% em 1950, 4% em 1960, 5,2% em 1970, 6,6% em 1980, 9% em 1991, 15,5% em 2000 e 22,2% em 2010. Segundo dados de 2016 do Instituto Datafolha, um terço da população nacional já é evangélico. Vale lembrar que este crescimento evangélico é, sobretudo, urbano (Lopes 2006) e localiza-se majoritariamente em favelas e periferias (Vital da Cunha 2018). Em meados dos anos 1990, a crescente presença evangélica em favelas cariocas se expressava na paisagem sonora, visual e estabelecia novos marcadores de sociabilidade (Mafra 1998; Vital da Cunha 2002 e 2014; Machado 2013; Alvito 2001). Os cultos numerosos ocorriam em templos, mas ocupavam o ambiente sonoro da favela. Assim também as músicas gospel e hinos eram entoados em diferentes espaços seja por seus moradores, individualmente, seja por comerciantes que exibiam às alturas o som das cantoras gospel da moda em cada momento. Em termos visuais, evangélicos estavam presentes no marketing das igrejas que disponibilizavam pelas ruas cartazes e faixas anunciando a presença de personalidades em seus cultos semanais, correntes, campanhas. Também havia as pinturas murais com referências a Jesus, ao exército de Cristo, a passagens bíblicas do Antigo e do Novo Testamento. A sociabilidade nas favelas também sofreu mudanças a partir desta reconfiguração religiosa do espaço: a festa junina, as comemorações de São Cosme e Damião, assim como de São Jorge perderam centralidade e deixaram de estabelecer os espaços de encontro e fruição públicos que representavam até início dos anos 2000 (Gomes 2009; Pitrez 2012). Na esteira destas mudanças, observamos o surgimento de relações entre atores sociais de universos morais socialmente distintos: cristãos evangélicos e traficantes de drogas. O fortalecimento desta relação, ora criticado por evangélicos e não evangélicos, ora incentivado como uma missão nobre produziu muitos corolários locais e supralocais. Em termos mais gerais, a figura do “traficante evangélico” no Rio de Janeiro ganhou publicidade na mídia em 2008 com a formação de grupos de combate à Intolerância Religiosa que apresentavam com alarde essa aproximação de traficantes com pentecostais e neopentecostais em favelas. Denunciavam a situação liminar, devastadora, violenta que representaria para religiosos de matriz afro-brasileira residentes nestas em favelas e periferias as composições entre criminalidade e redes evangélicas. Antes disso, já vinha sendo acompanhado por parte da bibliografia especializada, ao mesmo tempo em que em textos ficcionais, a formação de alianças e a conversão de muitos chefes do tráfico de diferentes favelas cariocas (Lins e Lourdes da Silva 1990; Lins 1997; Alvito 2001; Laranjeira 2004; Vital da Cunha 2008; Abumanssur 2008 e 2009; Teixeira 2011 e 2013). Estar no comércio ilegal de drogas e participar de redes e de cultos, campanhas e demais atividades religiosas evangélicas nas favelas já não era incomum. Embora integrem mundos sociais distintos, com diferentes convenções e moralidades, o fazer urbano e social nestas localidades permitiu uma aproximação entre um cristianismo da “batalha espiritual” com os “senhores da guerra” locais que produz ainda muitos desdobramentos.


Referências Bibliográficas
= Referências Bibliográficas =


ABUMANSSUR, E. S. (2009), “Religião violência”. In: A. M. L. Soares e J. D. Passos. (Org.). A fé na metrópole: desafios e olhares múltiplos. São Paulo: EDUC/Paulinas: 347-368.
ABUMANSSUR, E. S. (2009), “Religião violência”. In: A. M. L. Soares e J. D. Passos. (Org.). A fé na metrópole: desafios e olhares múltiplos. São Paulo: EDUC/Paulinas: 347-368.
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______. (2002), Ocupação evangélica: efeitos sociais do crescimento pentecostal na favela de Acari.Rio de Janeiro: Dissertação de Mestrado em Sociologia e Antropologia, PPGSA/UFRJ.
______. (2002), Ocupação evangélica: efeitos sociais do crescimento pentecostal na favela de Acari.Rio de Janeiro: Dissertação de Mestrado em Sociologia e Antropologia, PPGSA/UFRJ.


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