Marielle Franco: mudanças entre as edições

Sem resumo de edição
Sem resumo de edição
Linha 17: Linha 17:
<p style="text-align: justify;">A decisão de se candidatar a vereadora nas eleições de 2016 refletia o acúmulo político da trajetória pessoal e de militância de Marielle. Sua campanha foi realizada de forma reconhecidamente ousada e coletiva. Mulher na rua, na luta e na raça, #MulheRaça, foi o slogan de sua pré-campanha. Já durante a campanha, através do lema “Eu sou porque nós somos”, inspirado no provérbio africano “Ubuntu” anunciava sua candidatura como uma construção coletiva e suas posições como defensora de direitos humanos, feminista, favelada e negra. Já colocava em prática sua preocupação com a participação das mulheres nos espaços de decisão, viabilizando espaços infantis/recreativos em todas as atividades de campanha e posteriormente, de seu mandato. Esta experiência foi transformada em um panfleto orientador sobre espaços infantis para outros mandatos, partidos e coletivos. O material foi lançado durante o evento Mulheres na Política, realizado em 30 de novembro de 2017 pelo mandato, marcando a imensa importância das vozes das mães para a construção das políticas implementadas por Marielle Franco.</p> <p style="text-align: justify;">Como resultado dessa potente campanha, Marielle foi eleita eleita com 46.502 votos, a quinta parlamentar mais votada da cidade do Rio de Janeiro e a segunda mulher com mais votos. Gostava de sempre salientar que, de todas as urnas computadas na cidade do Rio de Janeiro, em 100% delas foram computados votos no 50777, seu número durante a campanha eleitoral de 2016.</p> <p style="text-align: justify;">Marielle chegou na &nbsp;Câmara com o “pé na porta” expressão recorrentemente usada por ela. Já no primeiro dia de legislatura, apresentou projetos de lei, realizou pronunciamentos marcantes e usou massivamente as redes sociais para divulgar seu trabalho coletivo e convocar a população à participação política. Entendendo a importância da internet como principal forma de comunicação nos dias de hoje, o mandato organizou dois encontros com ativistas transmitidos online através das redes sociais. O primeiro deles foi sobre feminismo nas ruas e nas redes, abordando toda a diversidade das mulheres feministas; o segundo foi sobre maternidade, mais uma vez demonstrando a importância do tema para a trajetória e atuação de Marielle.</p> <p style="text-align: justify;">Em um ano e três meses de uma “mandata”, que deveria ter durado pelo menos quatro, concretizou uma política feminista, em defesa da população negra, LGBT e de favelas. Apresentou 16 projetos de lei, presidiu a Comissão de Defesa da Mulher e foi nomeada relatora &nbsp;da Comissão Especial de acompanhamento da Intervenção Federal. Para isso, não chegou à Câmara sozinha, constituiu uma equipe majoritariamente feminina (mais de 80% eram mulheres), negra, com moradoras/es de favela, LGBTs e mães. Nomeou Lana de Holanda, mulher trans, primeira assessora na história da Câmara do Rio de Janeiro a conseguir o direito ao nome social em seu crachá funcional. Corpos que assim como o seu não eram reconhecidos como habituais naquele espaço e que ainda abriram as portas para outros. Jovens mulheres negras entraram pela primeira vez na Câmara para participar do “rolezinho” pelo palácio repleto de imagens coloniais; &nbsp;povos de religiões de matriz africana ocuparam o plenário para assistir o debate público “Awre aos nossos ancestrais - Reexistir na Fé!”; mulheres negras constituíram integralmente a mesa da entrega da Medalha Pedro Ernesto à Conceição Evaristo, numa noite emocionante com plenário e galerias cheias.</p> <p style="text-align: justify;">Mas não era só a Câmara municipal que Marielle e sua mandata ocuparam. Também estiveram nas ruas, por vários territórios da cidade. Realizaram o Seminário Direito à Favela, que aconteceu no Museu da Maré; o OcupaDH no Salgueiro, junto com a Comissão de Direitos Humanos na Alerj e a Associação de Moradores; visitou maternidades públicas do Rio de Janeiro; distribuiu pelos blocos de carnaval espalhados por todas as regiões da cidade mais de 200 mil leques da campanha “Não é Não! #carnavalsemassédio”, pela Comissão da Mulher.</p> <p style="text-align: justify;">Não ocupar a política sozinha era um compromisso político de Marielle Franco. Mulheres na política, evento realizado em novembro de 2017, foi o maior de seu mandato reunindo mais de 600 pessoas no auditório da ABI. O evento foi construído em articulação com mulheres que pretendiam se candidatar nas eleições seguintes.</p> <p style="text-align: justify;">Já no primeiro ano de mandato aprovou o projeto de lei que previa a criação de Casas de Partos no município. Na data em que completaram-se cinco meses de seu assassinato, fruto da incidência da bancada do PSOL, das e dos &nbsp;integrantes de sua “mandata” foram aprovados mais cinco dos projetos apresentados por Marielle. Assim, tornaram-se leis na cidade do Rio de Janeiro: o &nbsp;Programa de Espaço Infantil Noturno (Espaço Coruja), a criação da campanha de enfrentamento ao assédio e violência sexual nos transportes (Assédio não é passageiro), o Dia Municipal de Luta contra o encarceramento da Juventude Negra (20 de junho, marcando a data da prisão de Rafael Braga, jovem negro preso durante as manifestações de 2013), o Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra (25 de julho), o Programa de Efetivação de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto e a criação do Dossiê Mulher Carioca (que pretende reunir anualmente números sobre as mulheres atendidas por políticas públicas no município).</p> <p style="text-align: justify;">A frente da presidência da Comissão da Mulher, Marielle inovou ao trazer sua experiência anterior e torná-la também um espaço de atendimento às mulheres e não só um espaço burocrático. Neste período a comissão da mulher atuou no acolhimento, orientação e acompanhamento de 45 casos relacionados aos direitos das mulheres, desde casos de assédio na rua, assédio no ambiente de trabalho, agressão física, violência sexual e até feminicídios.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">Grande parte desta experiência está registrada no relatório da Comissão da Mulher, que já estava sendo produzido com os dados de trabalho do primeiro ano de trabalho. Após a noite de 14 de Março, o material foi finalizado pela equipe da Mandata Marielle Franco, revisado e ampliado para incorporar tudo que foi construído até o dia 14 de Março de 2018.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">A curta e intensa experiência da Mandata Marielle Franco&nbsp;repercutiu o feminismo que acreditamos, construído de gerações em gerações, traçando a política no coletivo, sem suprimir nossa diversidade. “Diversas mas não dispersas’! Não podemos deixar de apontar, no entanto, que seu término violento reflete a ausência de uma democracia plena em nosso país, negada a milhares de pessoas, que se sentiam representadas por Marielle Franco.</p>  
<p style="text-align: justify;">A decisão de se candidatar a vereadora nas eleições de 2016 refletia o acúmulo político da trajetória pessoal e de militância de Marielle. Sua campanha foi realizada de forma reconhecidamente ousada e coletiva. Mulher na rua, na luta e na raça, #MulheRaça, foi o slogan de sua pré-campanha. Já durante a campanha, através do lema “Eu sou porque nós somos”, inspirado no provérbio africano “Ubuntu” anunciava sua candidatura como uma construção coletiva e suas posições como defensora de direitos humanos, feminista, favelada e negra. Já colocava em prática sua preocupação com a participação das mulheres nos espaços de decisão, viabilizando espaços infantis/recreativos em todas as atividades de campanha e posteriormente, de seu mandato. Esta experiência foi transformada em um panfleto orientador sobre espaços infantis para outros mandatos, partidos e coletivos. O material foi lançado durante o evento Mulheres na Política, realizado em 30 de novembro de 2017 pelo mandato, marcando a imensa importância das vozes das mães para a construção das políticas implementadas por Marielle Franco.</p> <p style="text-align: justify;">Como resultado dessa potente campanha, Marielle foi eleita eleita com 46.502 votos, a quinta parlamentar mais votada da cidade do Rio de Janeiro e a segunda mulher com mais votos. Gostava de sempre salientar que, de todas as urnas computadas na cidade do Rio de Janeiro, em 100% delas foram computados votos no 50777, seu número durante a campanha eleitoral de 2016.</p> <p style="text-align: justify;">Marielle chegou na &nbsp;Câmara com o “pé na porta” expressão recorrentemente usada por ela. Já no primeiro dia de legislatura, apresentou projetos de lei, realizou pronunciamentos marcantes e usou massivamente as redes sociais para divulgar seu trabalho coletivo e convocar a população à participação política. Entendendo a importância da internet como principal forma de comunicação nos dias de hoje, o mandato organizou dois encontros com ativistas transmitidos online através das redes sociais. O primeiro deles foi sobre feminismo nas ruas e nas redes, abordando toda a diversidade das mulheres feministas; o segundo foi sobre maternidade, mais uma vez demonstrando a importância do tema para a trajetória e atuação de Marielle.</p> <p style="text-align: justify;">Em um ano e três meses de uma “mandata”, que deveria ter durado pelo menos quatro, concretizou uma política feminista, em defesa da população negra, LGBT e de favelas. Apresentou 16 projetos de lei, presidiu a Comissão de Defesa da Mulher e foi nomeada relatora &nbsp;da Comissão Especial de acompanhamento da Intervenção Federal. Para isso, não chegou à Câmara sozinha, constituiu uma equipe majoritariamente feminina (mais de 80% eram mulheres), negra, com moradoras/es de favela, LGBTs e mães. Nomeou Lana de Holanda, mulher trans, primeira assessora na história da Câmara do Rio de Janeiro a conseguir o direito ao nome social em seu crachá funcional. Corpos que assim como o seu não eram reconhecidos como habituais naquele espaço e que ainda abriram as portas para outros. Jovens mulheres negras entraram pela primeira vez na Câmara para participar do “rolezinho” pelo palácio repleto de imagens coloniais; &nbsp;povos de religiões de matriz africana ocuparam o plenário para assistir o debate público “Awre aos nossos ancestrais - Reexistir na Fé!”; mulheres negras constituíram integralmente a mesa da entrega da Medalha Pedro Ernesto à Conceição Evaristo, numa noite emocionante com plenário e galerias cheias.</p> <p style="text-align: justify;">Mas não era só a Câmara municipal que Marielle e sua mandata ocuparam. Também estiveram nas ruas, por vários territórios da cidade. Realizaram o Seminário Direito à Favela, que aconteceu no Museu da Maré; o OcupaDH no Salgueiro, junto com a Comissão de Direitos Humanos na Alerj e a Associação de Moradores; visitou maternidades públicas do Rio de Janeiro; distribuiu pelos blocos de carnaval espalhados por todas as regiões da cidade mais de 200 mil leques da campanha “Não é Não! #carnavalsemassédio”, pela Comissão da Mulher.</p> <p style="text-align: justify;">Não ocupar a política sozinha era um compromisso político de Marielle Franco. Mulheres na política, evento realizado em novembro de 2017, foi o maior de seu mandato reunindo mais de 600 pessoas no auditório da ABI. O evento foi construído em articulação com mulheres que pretendiam se candidatar nas eleições seguintes.</p> <p style="text-align: justify;">Já no primeiro ano de mandato aprovou o projeto de lei que previa a criação de Casas de Partos no município. Na data em que completaram-se cinco meses de seu assassinato, fruto da incidência da bancada do PSOL, das e dos &nbsp;integrantes de sua “mandata” foram aprovados mais cinco dos projetos apresentados por Marielle. Assim, tornaram-se leis na cidade do Rio de Janeiro: o &nbsp;Programa de Espaço Infantil Noturno (Espaço Coruja), a criação da campanha de enfrentamento ao assédio e violência sexual nos transportes (Assédio não é passageiro), o Dia Municipal de Luta contra o encarceramento da Juventude Negra (20 de junho, marcando a data da prisão de Rafael Braga, jovem negro preso durante as manifestações de 2013), o Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra (25 de julho), o Programa de Efetivação de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto e a criação do Dossiê Mulher Carioca (que pretende reunir anualmente números sobre as mulheres atendidas por políticas públicas no município).</p> <p style="text-align: justify;">A frente da presidência da Comissão da Mulher, Marielle inovou ao trazer sua experiência anterior e torná-la também um espaço de atendimento às mulheres e não só um espaço burocrático. Neste período a comissão da mulher atuou no acolhimento, orientação e acompanhamento de 45 casos relacionados aos direitos das mulheres, desde casos de assédio na rua, assédio no ambiente de trabalho, agressão física, violência sexual e até feminicídios.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">Grande parte desta experiência está registrada no relatório da Comissão da Mulher, que já estava sendo produzido com os dados de trabalho do primeiro ano de trabalho. Após a noite de 14 de Março, o material foi finalizado pela equipe da Mandata Marielle Franco, revisado e ampliado para incorporar tudo que foi construído até o dia 14 de Março de 2018.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">A curta e intensa experiência da Mandata Marielle Franco&nbsp;repercutiu o feminismo que acreditamos, construído de gerações em gerações, traçando a política no coletivo, sem suprimir nossa diversidade. “Diversas mas não dispersas’! Não podemos deixar de apontar, no entanto, que seu término violento reflete a ausência de uma democracia plena em nosso país, negada a milhares de pessoas, que se sentiam representadas por Marielle Franco.</p>  
= '''<span style="font-size:large;">Semente</span>''' =
= '''<span style="font-size:large;">Semente</span>''' =
<p style="text-align: justify;">Marielle Franco teve sua vida interrompida na noite de 14 de março de 2018, quando voltava para sua casa com seu motorista, Anderson Gomes, e sua amiga e assessora, Fernanda Chaves, única sobrevivente do atentado. Naquele dia, Marielle e outras mulheres negras realizaram a que seria a última atividade de Marielle “Jovens negras movendo as estruturas”, esta foi a última roda de conversa em que mulheres e toda a cidade puderam dialogar com Marielle. Na mesma noite, ainda atônitos com a notícia que parecia não fazer sentido, alguns militantes do PSOL, amigas e &nbsp;amigos próximos e assessoras de Marielle se reuniram para se abraçar. Enquanto isso, alguns eventos nas redes chamavam para uma mobilização na Cinelândia, em frente à Câmara Municipal, local que nitidamente nunca mais foi o mesmo após a passagem de Marielle.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">E foi o que aconteceu. Logo pela manhã, enquanto acontecia o velório na parte interna da Câmara Municipal, a praça já estava tomada de pessoas, em sua maioria mulheres, exigindo respostas sobre o crime. Outras cidades brasileiras também realizaram protestos e vigílias em memória de Marielle. Ao longo do dia, as ruas do centro da cidade, entre a Cinelândia e a Praça XV, estavam tomadas. Era possível perceber uma grande maioria de mulheres, em especial jovens e negras, &nbsp;chorando e se abraçando pela perda de uma representante que há muito a esquerda sonhava eleger. Durante todo o dia, o noticiário brasileiro e internacional repercutiu as poucas informações que existiam sobre o crime. Artistas, intelectuais e políticos manifestaram indignação e tristeza pelas redes sociais.</p> <p style="text-align: justify;">No dia 18 de março, outra emocionante manifestação marcou os quatro dias do assassinato de Marielle no local que tanto fez parte de sua vida. Cerca de cinco mil pessoas se reuniram na Maré em uma marcha que ecoava “Marielle e Anderson Presentes”. Sete dias depois, outra manifestação tomou as ruas do centro, da Candelária à Cinelândia, terminando com um enorme ato inter religioso. No dia em que se completou um mês do crime, milhares de pessoas refizeram seu último trajeto e de Anderson, caminhando da Lapa ao Estácio.</p> <p style="text-align: justify;">Desde o dia 14 de março, mensalmente há mobilizações pelo Brasil e pelo mundo em memória de Marielle Franco. Uma das mais marcantes aconteceu quando políticos de extrema-direita, do partido do presidente Jair Bolsonaro, quebraram uma placa de sinalização com o nome Rua Marielle Franco. Uma mobilização realizada na internet arrecadou dinheiro para confecção de milhares de novas placas para que as pessoas pudessem guardar de lembrança e multiplicar a placa quebrada. Foram mais de 1700 placas distribuídas no dia, outras placas foram confeccionadas depois.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">Marielle hoje é uma símbolo da luta internacional feminista e negra. Foi a principal homenageada 8 de Março (Dia Internacional de Luta das Mulheres) de 2019. O dia 14 de Março agora também faz parte do calendário de lutas dos movimentos feministas, LGBTs, negros e outros. Após mais de um ano de seu assassinato, seu rosto, nome e frases continuam estampados em grafites, cartazes, placas e intervenções urbanas espalhados pelo mundo. Nomeia coletivos feministas, negros, LGBTs, universitários, pré-vestibulares, assentamentos e ocupações por moradia, e a Tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Esta última, local onde por tantas vezes Marielle subiu para denunciar violações aos direitos humanos das mulheres, LGBTs, do povo negro e de favelas.</p> <p style="text-align: justify;">A frase que diz que Marielle virou semente se mostrou muito forte também durante o período eleitoral de 2018. Houve um considerável aumento de candidaturas de mulheres negras, refletindo também na eleição de algumas parlamentares negras, sobretudo nos partidos de esquerda. Em especial, três mulheres negras que compunham o mandato de Marielle Franco se candidataram e foram eleitas deputadas estaduais no Rio de Janeiro: Dani Monteiro, Mônica Francisco e Renata Souza.</p> <p style="text-align: justify;">Hoje, sua família e companheira são incansáveis na tarefa de representá-la mundo afora. As e os &nbsp;integrantes de sua mandata, suas amigas e amigos, companheiras e companheiros de partido e militância propagam a sua história e luta através de inúmeras iniciativas e registros dessa memória. Assim como estamos fazendo neste dicionário que leva seu nome.</p> <p style="text-align: justify;">Como ela disse em seu discurso de 8 de Março de 2018 &nbsp;“Não serei interrompida, não calarão a voz de uma mulher eleita”. Interromperam a sua vida, mas a trajetória de Marielle Franco, &nbsp;mulher negra, bissexual, em um relacionamento lésbico com o amor de sua vida, como ela mesma dizia, feminista e cria da favela, pautas que carregava em seu corpo e impressas na sua atuação política, continuará ecoando pelo mundo inteiro. '''Marielle, presente!'''</p>  
<p style="text-align: justify;">Marielle Franco teve sua vida interrompida na noite de 14 de março de 2018, quando voltava para sua casa com seu motorista, Anderson Gomes, e sua amiga e assessora, Fernanda Chaves, única sobrevivente do atentado. Naquele dia, Marielle e outras mulheres negras realizaram a que seria a última atividade de Marielle “Jovens negras movendo as estruturas”, esta foi a última roda de conversa em que mulheres e toda a cidade puderam dialogar com Marielle. Na mesma noite, ainda atônitos com a notícia que parecia não fazer sentido, alguns militantes do PSOL, amigas e amigos próximos e assessoras de Marielle se reuniram para se abraçar. Enquanto isso, alguns eventos nas redes chamavam para uma mobilização na Cinelândia, em frente à Câmara Municipal, local que nitidamente nunca mais foi o mesmo após a passagem de Marielle.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">E foi o que aconteceu. Logo pela manhã, enquanto acontecia o velório na parte interna da Câmara Municipal, a praça já estava tomada de pessoas, em sua maioria mulheres, exigindo respostas sobre o crime. Outras cidades brasileiras também realizaram protestos e vigílias em memória de Marielle. Ao longo do dia, as ruas do centro da cidade, entre a Cinelândia e a Praça XV, estavam tomadas. Era possível perceber uma grande maioria de mulheres, em especial jovens e negras, chorando e se abraçando pela perda de uma representante que há muito a esquerda sonhava eleger. Durante todo o dia, o noticiário brasileiro e internacional repercutiu as poucas informações que existiam sobre o crime. Artistas, intelectuais e políticos manifestaram indignação e tristeza pelas redes sociais.</p> <p style="text-align: justify;">No dia 18 de março, outra emocionante manifestação marcou os quatro dias do assassinato de Marielle no local que tanto fez parte de sua vida. Cerca de cinco mil pessoas se reuniram na Maré em uma marcha que ecoava “Marielle e Anderson Presentes”. Sete dias depois, outra manifestação tomou as ruas do centro, da Candelária à Cinelândia, terminando com um enorme ato inter religioso. No dia em que se completou um mês do crime, milhares de pessoas refizeram seu último trajeto e de Anderson, caminhando da Lapa ao Estácio.</p> <p style="text-align: justify;">Desde o dia 14 de março, mensalmente há mobilizações pelo Brasil e pelo mundo em memória de Marielle Franco. Uma das mais marcantes aconteceu quando políticos de extrema-direita, do partido do presidente Jair Bolsonaro, quebraram uma placa de sinalização com o nome Rua Marielle Franco. Uma mobilização realizada na internet arrecadou dinheiro para confecção de milhares de novas placas para que as pessoas pudessem guardar de lembrança e multiplicar a placa quebrada. Foram mais de 1700 placas distribuídas no dia, outras placas foram confeccionadas depois.&nbsp;</p> <p style="text-align: justify;">Marielle hoje é uma símbolo da luta internacional feminista e negra. Foi a principal homenageada de 8 de Março (Dia Internacional de Luta das Mulheres) de 2019. O dia 14 de Março agora também faz parte do calendário de lutas dos movimentos feministas, LGBTs, negros e outros. Após mais de um ano de seu assassinato, seu rosto, nome e frases continuam estampados em grafites, cartazes, placas e intervenções urbanas espalhados pelo mundo. Nomeia coletivos feministas, negros, LGBTs, universitários, pré-vestibulares, assentamentos e ocupações por moradia, e a Tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Esta última, local onde por tantas vezes Marielle subiu para denunciar violações aos direitos humanos das mulheres, LGBTs, do povo negro e de favelas.</p> <p style="text-align: justify;">A frase que diz que Marielle virou semente se mostrou muito forte também durante o período eleitoral de 2018. Houve um considerável aumento de candidaturas de mulheres negras, refletindo também na eleição de algumas parlamentares negras, sobretudo nos partidos de esquerda. Em especial, três mulheres negras que compunham o mandato de Marielle Franco se candidataram e foram eleitas deputadas estaduais no Rio de Janeiro: Dani Monteiro, Mônica Francisco e Renata Souza.</p> <p style="text-align: justify;">Hoje, sua família e companheira são incansáveis na tarefa de representá-la mundo afora. As e os integrantes de sua mandata, suas amigas e amigos, companheiras e companheiros de partido e militância propagam a sua história e luta através de inúmeras iniciativas e registros dessa memória. Assim como estamos fazendo neste dicionário que leva seu nome.</p> <p style="text-align: justify;">Como ela disse em seu discurso de 8 de Março de 2018 &nbsp;“Não serei interrompida, não calarão a voz de uma mulher eleita”. Interromperam a sua vida, mas a trajetória de Marielle Franco,&nbsp;mulher negra, bissexual, em um relacionamento lésbico com o amor de sua vida, como ela mesma dizia, feminista e cria da favela, pautas que carregava em seu corpo e impressas na sua atuação política, continuará ecoando pelo mundo inteiro. '''Marielle, presente!'''</p>  
&nbsp;
&nbsp;